quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Precomeço

Essa dor de solitude que associa-se a um partir
não é outra senão dor de precomeço,
deixada - então - de lado pelo enredo de permeio.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Desprezo Rasteiro

Desprezo me parece primitivo,
me vejo incomodado por sentí-lo.
Se acaso dependeres do desprezo
pra ter amenizada a dor da vida

não faça por onde eu desprezar possa.
Antes me infringirá o mal da tristeza.
Desprezarei a mim mesmo bem antes
de a alguém conceder baixeza tal.

Mas não foi fácil o descobrir desprezo,
antes quis tê-lo por saudade grande.
Ora, nem ausência de elevado grau

me entrevaria de forma tão rasteira.
Por desprezar se desprenderam coisas
de mim, que já não sou coisa que fora.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Um Domador de Versos

A quantidade de idéias
que me sufocaram
na manhã de hoje
- foi no caminho até aqui -

dariam vida aos versos
que eu quisera cantar
para alguém ou notícia
dar em alguma praça.

Ora, não os canto.
Não me encante! verso lascivo.
Mal sabes que a canto mais nobre
antepus desdém.

Perceba:
sua arte não tem ocasião.
Se te canto te abandono,
sem valor mesmo pra mim.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Doença Social

A moléstia patriarcal que me foi imposta
não a permitiu - mulher - mais que aguada
justificar-se ao meu paladar.
Subjugou-me a doença
do conceito mal formulado,
me contaminando com uma que
vindo
trouxe nas covas das costas
maneiras horizontais de outros sítios.

Pouco mais que insípida foi-me,
dada a doença antiquada que trago.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Diálogo

Estive com o poeta que
recolhido à sua ilha
me mandou chamar.
Fiz-lhe perguntas grosseiras, e ele
paciente a me ouvir,
respondeu-me com outros inquéritos
o que o calouro precisou saber.
Por parte dele, notei coragem
ao não se furtar de sua obra:
contou que queria salvar-se ao prêmio de uma canção.
- Em vida, não fiz outra coisa senão escutar voz cantante.

Resignação

Doença própria de cão,
surge a raiva ao portão:
- que seja aberta a porta agora para mim!

Zombeteiro era o tom
de uma resignação
(que adentrado havia antes):
- raiva sem compreensão, pra que tanta blasfêmia?

- Já não vivo o que é meu
por bastante querer ter vivência não minha...

Tendo voz acalmada
a sujeição conformada
outro tom demonstrou:

- então queres pular, palpitando de cama
para cama por ter visto assim proceder
quem esteve pra ti? Faz-te frouxa, revolta!
Em tempo vais te ver à minha calmaria.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Arte

Não me justifico senão pela necessidade;
não há espaço pra mim, embora esteja liberta.
- A arte ganhou as ruas! -
ora, quem grita?
será a própria rua? Quem grita?

Houve tempo em que me senti estimada, e
tanto valor me foi dado
que mesmo eu arte sendo,
estatuto de deusa me permiti.

Eis que me relativizaram importância
- como fizeram com todas as deusas os de vida curta.
Me acusam de sectarismo: e eu tenho opção?

Surgirá o compositor que me vai alçar com a sua música...

Quem grita?
Serão ecos de rua?
Salve-se as ruas...
Salve, quem puder, a mim.